Os superapps e a indústria da música

SupperApps

As novidades anunciadas pelo Rappi reforçam as investidas da empresa colombiana para se tornar um SuperApp. O Rappi Entertainment disponibilizará dentro do aplicativo opções para que os usuários tenham acesso a música, games e lives de eventos. Os produtos que estreiam a nova frente são Rappi Music, serviço de streaming musical, Rappi Games, opções de jogos no app, e o Rappi Live Events, uma solução para lives monetizadas ou gratuitas conectando artistas e criadores com a base de 30 milhões de usuários do app na América Latina. Além do Live Shopping, inspirado no Shopstreaming que tem viralizado fortemente na Ásia neste período de isolamento social.

 

O que são SupperApps 

Os SuperApps são aplicativos multiuso que oferecem uma grande diversidade de serviços e funções, especialmente combinando e-commerce, meios de pagamento, delivery e redes sociais. As principais referências são as chinesas: WeChat, Alipay e a japonesa LINE.

 

Antes, para se buscar modelos de inovação e projetar tendências bastava mergulhar no universo do Vale do Silício. O foco mudou, se você quiser estar afiado em inovação seus olhos devem apontar para o Oriente, no detalhe para a China.

 

O WeChat desponta como a principal referência com mais de 1 bilhão de usuários e o governo chinês já cogita usar a conta do usuário no superapp como um documento oficial de identificação.

 

O conceito do superapp contraria a escola do Vale do Silício de apps focados em nichos e se concentrando em um serviço realizado com excelência, mas cai como uma luva em países emergentes em que os consumidores buscam simplicidade, os devices não tem muito espaço, então a ideia de sitentizar vários apps em um só é interessante.  Por isso, Índia e América Latina se apresentam como candidatos para receberem novos SuperApps.

 

Enquanto as companhias asiáticas começam a chegar e influenciar o ocidente, as grandes empresas americanas de tecnologia se inspiram na China. Provavelmente, a Apple, Google e muito em breve a Uber devem caminhar para o conceito de SuperApp. A Amazon avança a passos largos para este lugar, a empresa de Jeff Bazos tem comprado empresas e feito parcerias White Label com empresas para absorver os seus serviços e oferecê-los na plataforma. Inclusive, este é o modelo que a Rappi optou para lançar o serviço de streaming de música em seu app, firmando parceria com a Kuack. 

 

 E a música com o SuperApps? 

O futuro da música não está mais na ponte LA, NY, Estocolmo e Londres. É fundamental que os profissionais do mercado da música acompanhem as transformações e inovações que vêm da Ásia. Afinal, o app que mais impactou o mercado musical do último ano é chinês, o TikTok é uma criação do grupo ByteDance. Provavelmente, os apps Q Music, KuWo, NetEase, entre outros podem ensinar muitas tendências ao ocidente.

 

É importante dizer que Tencent, dona do superapp WeChat, é a empresa que no início de 2020 comprou 10% da Universal Music por US$ 3,4 bilhões, tem 9,1% do Spotify e uma parceria com a empresa sueca para atuar na Ásia e tem investido fortemente em composição musical por Inteligência Artificial. 

 

Tão importante quanto a tecnologia e os recursos financeiros, é a estratégia e a conexão certa com a audiência. Existem diferenças culturais fundamentais entre Oriente e Ocidente que precisam ser consideradas. Uma delas é a relevância da música para o povo latino, bem como a força do mercado que é a região que mais cresce no mundo pelos últimos 10 anos. Dado que foi considerado pelo Rappi ao escolher o serviço musical como atratividade para a evolução do app.

 

Ao passo que os números de mercado endossam a estratégia, uma pesquisa do Google feita em agosto de 2019 indica os serviços prioritários que levariam os brasileiros a instalarem um superapp, os principais itens foram: Compras, Delivery, Passagens Aéreas, Serviços de Mobilidade, Serviços Financeiros. Não teve menção a conteúdos de entretenimento nas primeiras posições. Existe um trabalho forte de cultura a ser feito para que este universo de SuperApps realmente cative os brasileiros para consumo de entretenimento.

 

Entre tantas empresas que almejam se tornar um SuperApp, no Brasil a que aparenta estar mais preparada para conquistar o status é a Magazine Luiza. Além de todo trabalho de logística e visão da empresa, diferencia-se dos demais por há muito tempo estar de olho e endossar suas estratégias de acordo com as tendências na China.

 

Foto: Divulgação

Parcerias musicais e os papéis da relação

As parcerias estão presentes em diversos aspectos da nossa vida. É a partir delas que construímos relações, buscando satisfação na vida pessoal, superação de desafios e o sucesso profissional. Muito pouco se realiza sem colaboração. Com as parcerias é possível reunir pessoas que queiram construir algo maior e não conseguiriam realizar se estivessem sozinhas.

No dicionário, parceria significa a reunião de pessoas por interesse e objetivo comum. Na vida real, significa também ter de lidar com desencontros e desentendimentos inevitáveis, que surgem no decorrer de qualquer relação.

Em uma live feita pela dupla Anavitória no dia dos namorados, veio à tona uma questão relacionada à parceria da dupla com o artista e compositor Tiago Iorc. As artistas fizeram um desabafo por estarem sendo impedidas de regravar a obra “Trevo”, composta em conjunto com Iorc, que não liberou a regravação. Polêmicas à parte e sem entrar no mérito deste caso específico, essa história pode-nos ensinar valiosas lições sobre parcerias na área musical.

O mercado da música é marcado por relações de interdependência e colaboração. Filmes recentes, como “Bohemian Rhapsody” e “Rocket Man”, retrataram as relações da indústria fora dos palcos e deram destaque às poderosas parcerias entre os integrantes do Queen e de Elton John e Bernie Taupin, que juntos criaram canções que ficaram para a História. Parceiros na música são como sócios de uma empresa, que necessitam obedecer a regras para que a colaboração possa se desenvolver. Parte dessas regras é definida pela Lei de Direitos Autorais, outra parte pelos próprios coautores.

 

O que diz a Lei

Quando uma obra musical (e aqui falo em letra e melodia apenas)[1]é feita por dois ou mais autores, ela é criada em coautoria. A diferença entre as criações individuais e as obras em coautoria reside basicamente no controle e processo decisório dos direitos sobre a criação.

As obras realizadas em coautoria podem ser indivisíveis, quando não se identifica quem fez o quê; ou divisíveis, quando é possível reconhecer a criação individual de cada autor. As obras criadas por Elton John e Bernie Taupin, por exemplo, são divisíveis, já que Elton fazia as melodias e Bernie, as letras[2]. Neste caso, de acordo com a Lei brasileira[3], cada um dos autores pode utilizar livremente a sua parte da criação, desde que possa ser desmembrada da obra final, e que seu uso não prejudique a exploração da criação comum.

Quando a obra é indivisível, como ocorre frequentemente em composições musicais – e parece ser o caso da obra criada por Anavitória e Tiago Iorc -, nenhum dos coautores poderá publicar ou autorizar a publicação da mesma sem a autorização dos demais autores. Não havendo consenso entre eles, a maioria decide. A Lei não define o que significa maioria (se de autores ou de quem detém a maior participação na obra) e nem esclarece o que ocorre em caso de empate. É justamente isso que dá, a um dos compositores, a possibilidade de proibir o outro de gravar ou regravar a música feita a partir da parceria, ainda que em um projeto pessoal[4].

 

Contratos, controle e participação nos lucros

As demais regras da parceria podem ser determinadas pelas partes por meio de contratos. É prática entre autores negociar o seu percentual de participação na composição da música. Esse percentual representará os direitos de cada autor nos lucros da obra musical. Geralmente essa divisão é feita dependendo do quanto cada um contribuiu para a criação da obra e a relevância e influência que cada compositor possui no mercado.

Com o fechamento da negociação, cada autor irá administrar o controle da sua parte na obra e a sua parcela de ganhos, deixando de fora muitos pontos da parceria que mereceriam uma discussão mais aprofundada. Com isso, os parceiros perdem uma valiosa oportunidade de discutir as suas expectativas com relação àobra e à parceria em si. O que acontece caso haja um conflito de interesses envolvendo a obra? E se um dos parceiros discordar de uma decisão? Poderá cada um desregravar e regravar a obra criada sem a necessidade de aprovação dos demais autores? Estes são exemplos de possíveis conflitos, mas pode haver outras preocupações por parte de cada autor.

Todas as questões levantadas pelos parceiros poderiam ser discutidas e colocadas em um contrato. Combinando tudo antes, parte dos conflitos estará superada, já que o contrato definirá a forma como a questão será resolvida. Contratos não precisam ser complexos ou de difícil entendimento. Além disso, a afirmação de que uma negociação entre parceiros pode prejudicar a capacidade criativa é apenas um mito.

 

Valorização da negociação sobre uma disputa judicial

Se por alguma razão ocorrer algum conflito inesperado em que as partes não conseguem manter um contato pessoal, elas mesmas podem definir um canal de comunicação, indicando as pessoas que assumirão a conversa. Caso o conflito não seja solucionado, os autores podem buscar formas alternativas para resolver a disputa, valorizando o diálogo na tentativa de dar fim à questão de forma amigável.

Escolher uma pessoa para facilitar o diálogo em um processo de mediação pode ser uma solução. A mediação pode ocorrer de maneira informal ou dentro de um processo estabelecido pela Lei[5]. Em ambos os casos, o mediador será a figura que apenas facilitará o diálogo, ajudando as partes a equilibrar os seus interesses individuais com os interesses da parceria. A decisão sobre um acordo caberá exclusivamente aos autores. Uma negociação pode reduzir tempo e custo, além de dar às partes algum controle sobre as decisões, o que certamente não ocorrerá em uma disputa judicial ou em um processo de arbitragem.

Conflitos são inevitáveis em qualquer parceria. A forma como vamos resolvê-los pode ser simples ou complicada, tensa ou tranquila, tradicional ou criativa. Não existem parcerias perfeitas, e nem toda colaboração resulta em uma relação de amizade. Alinhar expectativas por meio de contratos no início da parceria deixa claro para cada parte o que um parceiro espera do outro.Ao final, o segredo de uma parceria de sucesso é a comunicação aberta e honesta.

[1]Os direitos autorais sobre a música surgem a partir da composição da obra musical (letra e melodia). Quando uma música é gravada, dois direitos passam a coexistir: os direitos autorais sobre a obra musical, que pertencerá originalmente aos autores e os direitos conexos relativos a gravação da obra (fonograma), que caberão aos artistas, músicos e ao produtor fonográfico (que pode ser uma gravadora, um selo ou um artista independente).

[2]“O verso musical pode ser editado apenas como letra, e a melodia através de partitura, com ou sem letra. Ambas são obras protegidas isoladamente, o verso como texto literário e a melodia como obra musical”. ABRÃO, Eliane Y. Direitos de autor e direitos conexos. 1 Ed. São Paulo: Editora do Brasil, 2002, p.p. 101

[3]art. 15, § 2º da Lei 9.610: “§ 2º Ao coautor, cuja contribuição possa ser utilizada separadamente, são asseguradas todas as faculdades inerentes à sua criação como obra individual, vedada, porém, a utilização que possa acarretar prejuízo à exploração da obra comum.”

[4] Lei 9.610, Art. 32: “Quando uma obra feita em regime de coautoria não for divisível, nenhum dos coautores, sob pena de responder por perdas e danos, poderá, sem consentimento dos demais, publicá-la ou autorizar-lhe a publicação, salvo na coleção de suas obras completas.

  • 1º Havendo divergência, os coautores decidirão por maioria.”

[5] Lei 13.140/2015, arts. 21 a 23

 

Foto: Divulgação

 

Recordações do Futuro

Nesse momento de permanente transição do mercado musical, vale a pena refletir sobre os efeitos dessa nova era do streaming no imaginário das novas gerações.

Que tipos de lembranças e recordações ela irá gerar?

Andando pelas poucas livrarias que insistem em não se transformar em farmácias, é comum nos depararmos com livros narrando as trajetórias de rádios que fizeram parte da história de várias gerações de ouvintes mundo afora.

Publicações como “A Onda Maldita (Como Nasceu A Fluminense FM)” (de Luiz Antônio Mello), “A Caixa Mágica: Histórias De Vida Pelas Ondas Do Rádio” (do locutor Fernando Mansur) e “Todo Dia É Dia de Peel” (sobre o lendário John Peel, da Rádio BBC) são exemplos desse revival.

Isso tudo nos remete ao que um dia já foi o apogeu da indústria fonográfica: capas de disco conceituais (das gravadoras Blue Note e Elenco), ou eternamente pops como as do Pink Floyd e Led Zeppelin, concebidas pelos art designers da britânica Hipgnosis.

Tudo isso somado a um marketing intuitivo sem precedentes, que transformava bandas e artistas iniciantes de pequenos pubs em estrelas internacionais.

E o que nos reserva o futuro? Sobre o que versarão os novos livros ou e-books?

As playlists se tornarão inesquecíveis, ou tudo não passará apenas de uma simples comparação entre modelos de negócios dos principais players do mercado da era do streaming?

Saem de cena o vinil, as jukeboxes e os cds, e entram em campo os algoritmos e os coaches da inteligência artificial, com suas métricas digitais infalíveis!

As novas tribos se esquecerão assim daquilo que nunca lembraram: das capas dos discos que marcaram sua infância, da loja em que eles foram comprados com o dinheiro de suas mesadas, e do arranhão inesperado no disco dos Beatles em suas festas de 15 anos…

E assim então todos terão chips de memórias e recordações implantados, como em Blade Runner!

Mas, seja qual for o ritmo, seja qual for o andamento, uma única certeza ainda haveremos de ter.

Todos nós falaremos — e ouviremos! — a mesma língua. A música.

[Artigo Exclusivo] Cultura – crise e oportunidade

Dentre as inúmeras definições que o dicionário de língua portuguesa nos dá sobre o substantivo feminino “CULTURA” estão: 1) Conjunto dos hábitos sociais e religiosos, das manifestações intelectuais e artísticas, que caracteriza uma sociedade. 2) Conjunto dos conhecimentos adquiridos.

O próprio significado do termo revela a complexidade e amplitude do tema. Então vamos combinar que esse artigo não objetiva o esgotamento da questão, mas uma breve reflexão motivada pelas mais recentes manifestações da classe cultural na mídia e nas redes sociais.

A divulgação das alterações nas regras da Lei Rouanet foi o estopim para um levante de manifestações contra e a favor. Melhor assim, a classe cultural resolveu se mobilizar. Mas para qual direção?

Vivemos um desmanche da cultura que, ao contrário do que se diz ultimamente, não tem origem em 2019, remonta ainda ao Século XX. Foi por escolhas erradas não de um, mas de todos os governos das últimas décadas, e por que não dizer, da elite intelectual de cada época, que chegamos ao estado cultural deplorável de hoje. Uma dependência absoluta de tutela e subsídio público, uma total subserviência da classe artística falante aos poderosos da hora, uma população que não lê, não frequenta museus ou espaços culturais, que não tem memória, não guarda suas tradições, que é incapaz de consumir mais do que o gênero musical da moda. A meu ver, as alterações nas regras da Lei são boas e eram necessárias. Cabe uma nova revisão em um aspecto ou outro? Acredito que sim. No entanto, em meio à tragédia cultural que só se agrava e que inviabiliza o combalido “país do futuro”, a prioridade que está sendo dada ao aspecto paleativo do problema (sim, lei de incentivo é paleativo dos mais superficiais) é preocupante.

Mas crise é oportunidade. Vejo o momento como oportuno para a abertura de um novo debate buscando outros ângulos de visão. Precisamos escapar à mentalidade positivista que ignora o papel da cultura na formação da sociedade, mas também ao dirigismo estatal que no lado oposto vinha usando a força da cultura como arma revolucionária. A classe artística perdeu a independência e se acomodou na dependência, que beneficia a poucos de forma randômica e insuficiente. Subsídios não são sempre ruins, mas têm sido usados como a única política pública existente e esse talvez seja o principal problema. Veja, a tal da democratização dos bens culturais que tornou quase tudo subsidiado, influenciou o consumo de mais de uma geração (Lei da meia entrada, Sesc, Sesi, leis de incentivo, editais de empresas públicas e privadas, etc.). Uma produção cultural imensa e nem sempre de boa qualidade, oferecida de graça, desabituou o cidadão a pagar pelo consumo de cultura e a desvalorizou por consequência. Quebrou pequenos e médios teatros, casas noturnas, cinemas. Deixou o artista à mercê não de um público consumidor, mas do gestor cultural, curador, profissional de marketing de uma empresa patrocinadora, enfim, daqueles que detém o poder de decidir quem entrará em uma programação, quem será patrocinado, e também, em última instância, o que o público deve consumir. Na outra ponta, o modelo adotado de educação botou a pá de cal na formação de novas plateias, destruindo o seu interesse pela instrução, pela história e pela cultura. O investimento privado sumiu como também sumiu o público pagante, e aos poucos até mesmo o gratuito. O desinteresse pela produção histórica e cultural no Brasil, que não se caracterize por entretenimento puro e simples, é amplo e irrestrito. E nessa arapuca nos encontramos.

Vejo como positiva a ruptura ao modelo coletivista que vinhamos adotando para, já sem as amarras do dirigismo governamental, quem sabe enfrentarmos um debate verdadeiro sobre como conduzir políticas públicas para a cultura no Brasil. Conclamo pelo debate respeitoso e honesto que nos levará à construção e proposição de um modelo novo de cultura para o Brasil, respeitando a diversidade de pensamento na busca por um centro comum.

 

Foto: Pexels

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