Desde que se iniciaram, em meados dos anos setenta do século passado, eu assisto a transmissão pela televisão do desfile de escolas de samba do Rio de Janeiro.

Nesses quarenta anos (cacilda , como eu estou velho!), contam-se nos dedos os carnavais em que eu não estive pelo menos algumas horas em frente a televisão.

Acompanhar os desfiles na televisão despertou meu interesse pelo universo das escolas de samba, por isso agarrei, quando surgiram, todas as oportunidade de assisti-lo “in loco”. Pude então constatar a verdade do que todo mundo dizia sobre a transmissão dos desfiles: –  A televisão não reproduz nem uma pálida impressão do que se sente estando na avenida. Uma verdade que acredito que permanecerá não importa quanto se desenvolva a tecnologia de reprodução audiovisual.

Mas como quem não tem cão, caça com gato e convites para o sambódromo caros e raros, permaneço um contumaz assistente dos desfiles na tevê. Esse ano, como em tantos outros, me sentei no sofá para a maratona, que dada a duração da empreitada, inclui invariavelmente idas e vindas , conversas paralelas, interrupções e cochilos. Não resisti nem as duas primeiras escolas.

Algum gênio resolveu que o papel do samba-enredo na transmissão dos desfiles é servir de fundo musical para o time de comentaristas da televisão. Ouve-se o samba em primeiro plano uma vez, quando a escola inicia o desfile e isso é tudo. No resto do tempo, tome considerações sobre fantasias, alegorias, destaques e celebridades, tudo com um batuque distante e indistinto ao fundo.

Na verdade a transmissão desse ano foi apenas a culminância de uma longa trajetória rumo a irrelevância do samba, no desfile das escolas de SAMBA.  Imagino que para outras pessoas, que não tem relação maior com a música, a submissão total do samba aos brilhos e paetês não cause maior incômodo.  Para mim é razão de infinita irritação.

Infelizmente, o caso do desfile das escolas de samba não tem nada de único. Produtores e diretores brasileiros costumeiramente ignoram completamente a primeira parte da expressão audiovisual.

Transmissões de shows musicais são outra coisa que regularmente me fazem espumar de raiva. Há verba para cenários, apresentadores, vinte e cinco câmeras, gruas, satélites, mas nunca para uma mesa de mixagem e um profissional experiente para opera-la.

A cultura de desconsideração pelo áudio na produção audiovisual brasileira vem de longe, e foi ela que levou a ideia, disseminada nas tevês por décadas, que programas musicais não dão audiência.

Mas há um fio de esperança nesse cenário de desolação. O programa “The Voice” da Rede Globo é um sucesso absoluto e não por acaso seus números musicais são criados e produzidos por profissionais de música e áudio do primeiro time.

Poderia ser um caminho para a salvação do casamento do áudio com o visual, mas não me surpreenderá se atribuírem o sucesso do programa aos personagens, ao cenário, ou a direção de imagens.

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