Dentre as inúmeras definições que o dicionário de língua portuguesa nos dá sobre o substantivo feminino “CULTURA” estão: 1) Conjunto dos hábitos sociais e religiosos, das manifestações intelectuais e artísticas, que caracteriza uma sociedade. 2) Conjunto dos conhecimentos adquiridos.

O próprio significado do termo revela a complexidade e amplitude do tema. Então vamos combinar que esse artigo não objetiva o esgotamento da questão, mas uma breve reflexão motivada pelas mais recentes manifestações da classe cultural na mídia e nas redes sociais.

A divulgação das alterações nas regras da Lei Rouanet foi o estopim para um levante de manifestações contra e a favor. Melhor assim, a classe cultural resolveu se mobilizar. Mas para qual direção?

Vivemos um desmanche da cultura que, ao contrário do que se diz ultimamente, não tem origem em 2019, remonta ainda ao Século XX. Foi por escolhas erradas não de um, mas de todos os governos das últimas décadas, e por que não dizer, da elite intelectual de cada época, que chegamos ao estado cultural deplorável de hoje. Uma dependência absoluta de tutela e subsídio público, uma total subserviência da classe artística falante aos poderosos da hora, uma população que não lê, não frequenta museus ou espaços culturais, que não tem memória, não guarda suas tradições, que é incapaz de consumir mais do que o gênero musical da moda. A meu ver, as alterações nas regras da Lei são boas e eram necessárias. Cabe uma nova revisão em um aspecto ou outro? Acredito que sim. No entanto, em meio à tragédia cultural que só se agrava e que inviabiliza o combalido “país do futuro”, a prioridade que está sendo dada ao aspecto paleativo do problema (sim, lei de incentivo é paleativo dos mais superficiais) é preocupante.

Mas crise é oportunidade. Vejo o momento como oportuno para a abertura de um novo debate buscando outros ângulos de visão. Precisamos escapar à mentalidade positivista que ignora o papel da cultura na formação da sociedade, mas também ao dirigismo estatal que no lado oposto vinha usando a força da cultura como arma revolucionária. A classe artística perdeu a independência e se acomodou na dependência, que beneficia a poucos de forma randômica e insuficiente. Subsídios não são sempre ruins, mas têm sido usados como a única política pública existente e esse talvez seja o principal problema. Veja, a tal da democratização dos bens culturais que tornou quase tudo subsidiado, influenciou o consumo de mais de uma geração (Lei da meia entrada, Sesc, Sesi, leis de incentivo, editais de empresas públicas e privadas, etc.). Uma produção cultural imensa e nem sempre de boa qualidade, oferecida de graça, desabituou o cidadão a pagar pelo consumo de cultura e a desvalorizou por consequência. Quebrou pequenos e médios teatros, casas noturnas, cinemas. Deixou o artista à mercê não de um público consumidor, mas do gestor cultural, curador, profissional de marketing de uma empresa patrocinadora, enfim, daqueles que detém o poder de decidir quem entrará em uma programação, quem será patrocinado, e também, em última instância, o que o público deve consumir. Na outra ponta, o modelo adotado de educação botou a pá de cal na formação de novas plateias, destruindo o seu interesse pela instrução, pela história e pela cultura. O investimento privado sumiu como também sumiu o público pagante, e aos poucos até mesmo o gratuito. O desinteresse pela produção histórica e cultural no Brasil, que não se caracterize por entretenimento puro e simples, é amplo e irrestrito. E nessa arapuca nos encontramos.

Vejo como positiva a ruptura ao modelo coletivista que vinhamos adotando para, já sem as amarras do dirigismo governamental, quem sabe enfrentarmos um debate verdadeiro sobre como conduzir políticas públicas para a cultura no Brasil. Conclamo pelo debate respeitoso e honesto que nos levará à construção e proposição de um modelo novo de cultura para o Brasil, respeitando a diversidade de pensamento na busca por um centro comum.

 

Foto: Pexels

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