Caríssimos,
Há muitas coisas no psiquismo humano que estão além da minha compreensão. Gostar de filme de terror, por exemplo, é uma coisa que não entra na minha cabeça. Então o sujeito sai de casa para ficar tenso e tomar susto e ainda paga um ingresso para isso? Não dá para entender.
Eu sei … eu sei que há milhões de criaturas pelo mundo que fazem fila para ver esses filmes, que cultuam sub-gêneros , que desfilam orgulhosos vestidos em camisetas estampadas com o boneco assassino e o Freddy Kruger. Entendo perfeitamente essa realidade, não quero banir os filmes de terror da face da terra só porque eu não gosto deles. Não acho que haja nada de errado em alguém gostar de se apavorar em frente a uma tela de cinema, só não sou capaz de entender qual é o prazer que elas sentem nisso.
Outra coisa que desafia o meu entendimento é a mania por listas.
Sei que listas são utilissimas e necessárias para catalogar e relacionar objetos, pessoas e informação. Mais que isso, fazer listas é mesmo uma forma essencial de organizar o pensamento. Nada contra listas. Eu também faço listas de compras , listas de coisas para fazer.
O interesse em listas úteis eu entendo perfeitamente , o que eu não consigo compreender é o fetichismo com listas. Porque as listas úteis geralmente só interessam a quem precisa delas. O bibliotecário ou o arquivista precisam de listas e fazem bom uso delas , mas ninguém que não sejam eles, quer ler a lista dos livros da biblioteca ou dos ítens do arquivo. As listas que fazem sucesso , que todos querem ler e palpitar sobre , são as listas-fetiche, os 1000 lugares para ir antes de morrer, os 100 maiores discos da história.
São as listas com critérios obscuros e arbitrários , que relacionam coisas díspares apenas pela vontade do autor, que se caracterizam pela sua absoluta inutilidade prática , as que despertam interesse apaixonado e discussões calorosas. Os marqueteiros e a imprensa as adoram , porque são garantia de polêmica e de audiência.
O sujeito que inventou o “hit parade” (ou seja lá o nome que essa lista de músicas mais populares de um certo momento teve quando começou), foi sem dúvida o maior marqueteiro de música de todos os tempos. É bem provável que ele tenha sido um marqueteiro involuntário, que sua intenção ao fazer a lista fosse apenas a de ser útil aos comerciantes para estocarem suas lojas com os discos que o público estava mais propenso a comprar.
O certo é que o Hit Parade, Top Ten , Hot 40, Viral 50 e todas as suas variações, faz algum tempo deixaram de ter qualquer utilidade prática para os profissionais da música , hoje são apenas uma lista fetiche para consumidores de música interessados em novidades.
Duvida?
Hoje João, meu filho mais velho, veio jantar comigo. Chegou extasiado da experiência que teve ontem no concerto de Kamasi Washington no Teatro Municipal. Casa cheia , público em número e animação que superaram em muito as expectativas dos artistas e da produção.
Kamasi , quem?? Pois é. Um ilustre desconhecido para a grande maioria dos consumidores de música. Liniker e os Caramelows é um exemplo brasileiro de um artista que nunca passou nem perto das paradas de sucessos , mas lota teatros pelo país. Como eles, há toda uma geração de artistas formando públicos nada desprezíveis embaixo dos nossos narizes, sem que nós sintamos nem o cheiro deles.
É todo um mundo novo e maravilhoso esse da música pós-Top Ten.